20 de novembro de 2014

Feminismo Infantil

Uma das maiores discussões hoje em dia sobre criação dos filhos é o balanço entre colocar limites e aplicar "castigos". Em um post muito interessante,  a Dra. Laura Markham defende que a gente não pode mudar os outros, mas a gente pode mudar o que eles querem, através de diálogo, compreensão e opções.

Concordo plenamente com ela de que a melhor maneira de resolver qualquer conflito (com filhos, ou com qualquer outra pessoa) é descobrir o por que do conflito, entender as razões do outro, e tentar achar uma solução que agrade a todos. 

Mas esta atitude tem que ser adaptável, principalmente quando o assunto é violência entre crianças. Eu percebo que nossa sociedade tem uma atitude muito leniente com relação à violência, principalmente entre meninos. Aliás, se o menino não for um pouco violento, os pais se preocupam. O menino que apanha na escola é visto com maus olhos, tem que aprender a se defender, o que bate “é natural da idade, quando ele crescer melhora”. Isto não é um comportamento isolado, de um menino. Vi acontecer dezenas de vezes nestes oito anos desde que minha filha mais velha nasceu.

Como mãe de duas meninas que apanham de meninos pelo menos uma vez por mês, é muito doloroso observar que minhas filhas aprendem que apanhar de meninos é natural da idade. 

Lembro quando minha mãe tentou argumentar com um menino que falou para ela: “Vou machucar sua filha”. A Alice tinha 3 anos, e estava na piscina de bolinhas de um shopping. Minha mãe, achando que ele estava só provocando, respondeu: “Ela não é minha filha, é minha netinha. E não machuca ela não, você é grande, ela é pequena.” O menino virou as costas, e pulou com os dois pés em cima da Alice. Minha mãe ficou chocada (óbvio). Perguntou onde estava a mãe dele, ele respondeu: “minha mãe não está aqui e minha babá está fazendo compras”. O que restou para minha mãe fazer? Consolar Alice, que, aos prantos, não queria mais brincar. Agora, se minha mãe tivesse tomado uma atitude mais enfática, será que o resultado seria o mesmo?

Está na hora de aplicarmos às meninas os mesmos direitos das mulheres. Ninguém tem o direito de bater em outra pessoa.

Por isto, defendo que tem horas que, para impedir um comportamento agressivo, a gente tem que ser mais direta. Prefiro ensinar minhas filhas que, se alguém tentar bater nelas, terá alguém mais forte para defendê-las, do que deixar que elas apanhem para depois ouvirem um pedido de desculpas, muitas vezes vindo da mãe da criança.

E o que eu chamo de uma atitude mais direta? Claro que eu não vou bater ou ameaçar fisicamente a criança (afinal, eu acabo de defender que ninguém tem o direito de fazer isto). Primeiro vou tentar impedir a violência antes de acontecer (segurando o braço, ou afastando minha filha), eu vou falar sério com o agressor, muito sério. Vou ficar brava sim. Não vejo motivo para esconder minha raiva, uma vez que o que a criança está fazendo é muito errado. Se o responsável estiver por perto, vou pedir a ele que faça isto. Se não estiver, eu mesma vou fazer. 

Impedir a violência contra minhas filhas impede que elas sintam a dor que vem associada com ela. Ser mordida ou agredida uma vez, em um parquinho, pode não significar muito na vida delas. Mas, quando estas agressões acontecem com frequencia, vinda de diferentes meninos, na escola, no parquinho, com amiguinhos do prédio, eu tenho certeza de que isto deixa uma marca. 

Em raríssimas ocasiões eu vi uma mãe realmente mostrar para o filho agressor que a atitude dele era inaceitável. Na maioria das vezes, ela pede desculpas pelo filho, fala com voz doce: "não pode morder o coleguinha..." e pede para ele beijá-la. Não quero que este menino beije minha filha após agredí-la! Ele provavelmente também não quer! Ele agrediu ela por algum motivo, e é este motivo que tem que ser entendido, e solucionado melhor.

Eu sei que a mãe do menino que bate realmente não quer que isto aconteça. Na grande maioria das vezes, está triste e envergonhada. Mas também não quer tomar uma atitude mais séria e se sentir rígida demais, que não ouve o filho, não o entende. 

Para mim, a única coisa que vai fazer ele parar a agressão é mostrar, de uma forma clara para ele, que esta atitude é inaceitável. Mesmo. Retirá-lo do parquinho, levantar a voz com ele, tirar um brinquedo favorito funcionará muito mais, se ele for pequeno, do que palavras suaves que ele não entende completamente ("desculpa", "não vou fazer mais").

Eu acredito nisto porque já estive do lado agressor, quando minha filha agrediu um colega, não fisicamente, mas estragando o material escolar dele, perseguindo ele, convencendo outros colegas a tratarem o menino mal. Quando eu fiquei sabendo, falei com ela como eu estava muito triste e com raiva da atitude dela, que isto era inaceitável e suspendi as atividades extra-curriculares dela. Conversei na escola, e combinei com a coordenadora pedagógica que, quando a agressão parasse, e ela pedisse desculpas sinceras a ele, ela poderia voltar. Além disto, procuramos ajuda profissional para entender por que ela estava com tanta raiva dele. Depois de dois meses neste processo, a agressão parou, e hoje ela e o menino são amigos.

Eu a ouvi. As razões dela explicam, mas não justificam. Apesar de estar do lado dela o tempo todo, eu deixei bem claro que o que ela estava fazendo era injusto com ele, provocava sentimentos ruins em todos, e era contra os nossos valores de amizade e respeito ao próximo. Eu não acho que esconder, ou amenizar nossos sentimentos (no caso minha tristeza e raiva por saber que ela estava sendo injusta e cruel com um colega) seja educativo para nossas crianças. Elas precisam saber que temos valores sérios, e que existem coisas que são descuidos leves ("não põe papel de bala na boca") e assuntos sérios ("não bate no coleguinha"). 

Se as crianças não aprenderem pela nossa reação a diferença, como aprenderão?

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