Explicação sobre este post: em 2010, rolou no Twitter a seguinte proposta: "Se você pudesse mandar um tweet para você mesmo aos 16 anos, o que você diria em 140 caracteres?"
Diversas respostas me entusiasmaram, e eu tentei escrever algo. Entretanto, o limite de 140 caracteres acabou sendo inaceitável, e acabei escrevendo a carta texto abaixo. Naquela época minha filha Alice tinha quatro anos, eu estava lidando com sentimentos difíceis sobre maternidade e trabalho.
Outro ano se passou, e várias coisas mudaram. Farei 36 anos, e achei que estava na hora de escrever outra carta. Escrevi para eu mesma aos 36 anos, este outro post Carta para mim mesma aos 36 anos que é a continuação deste. Espero que ele possa tocar o coração de outras mães, de todas as idades.
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Oi, Eu aos 16 anos.
Diversas respostas me entusiasmaram, e eu tentei escrever algo. Entretanto, o limite de 140 caracteres acabou sendo inaceitável, e acabei escrevendo a carta texto abaixo. Naquela época minha filha Alice tinha quatro anos, eu estava lidando com sentimentos difíceis sobre maternidade e trabalho.
Outro ano se passou, e várias coisas mudaram. Farei 36 anos, e achei que estava na hora de escrever outra carta. Escrevi para eu mesma aos 36 anos, este outro post Carta para mim mesma aos 36 anos que é a continuação deste. Espero que ele possa tocar o coração de outras mães, de todas as idades.
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Oi, Eu aos 16 anos.
Eu, aos 16 anos. (Sou a 3a na fileira de trás, de cabelo curto, blusa branca e saia preta.) |
Quando crescer, você vai descobrir que não é homem. Sim, eu sei, parece óbvio, né? Mas você não sabe disto, minimiza e acha que pode ser tudo o que os
homens podem ser. Não, não pode.
Sim, você pode fazer Engenharia Elétrica, mas você não vai trabalhar
como Engenheira, porque, quando fizer a seleção na FIAT, vai ficar em 6o lugar
(5 vagas) entre 2.000 candidatos.
E, sim, você pode estudar muito, fazer seu Doutorado, mas quando for
fazer o concurso (já com Doutorado), vai ficar em segundo lugar (1 vaga) porque
o cara que ficou em primeiro estudou sem parar, mesmo com o filho dele na UTI.
Sim, você pode trabalhar fora, mas vai ter que escolher entre: deixar sua
filha com uma babá com menos cultura, pouco preparo psicológico e escolhas
religiosas diferentes das suas OU ter um emprego que pague bem.
Além disto tudo, mesmo casando com um cara que acredita na igualdade de
oportunidades, não é machista e te ama muito, você vai ser responsável por
todas as tarefas domésticas.
Você vai se culpar a cada hora do dia que está trabalhando porque não
está com sua filha. E cada hora do dia que está com sua filha porque não está
trabalhando. Você não vai fazer grandes coisas, e nem ser a melhor do seu campo de
trabalho, porque vai ter sempre algo para você resolver, seja a descarga que
não funciona, a compra do supermercado, a vacina da sua filha, as contas a
pagar no banco.
E você vai estar trabalhando fora, sim. Ganhando (sempre) um terço do
que seu marido ganha, mesmo quando trabalham o mesmo tanto de horas. E sendo
menosprezada pelos seus alunos de Engenharia cada vez que o semestre começar,
porque você é mulher. Você vai ter que convencê-los a cada semestre que você
sabe do que está falando, e às vezes eles serão rudes com você, e eles nunca
vão te respeitar de cara.
Sei que você está pensando: eu não vou ser assim, eu vou ter uma boa
empregada e vou organizar meu tempo. Não vai, não. Seu tempo vai acabar no dia
que sua filha nascer, porque cada minuto do seu dia será dedicado a pensar nos
outros. Depois de quatro anos sem nem cortar cabelo, você um dia vai ter uma
crise de depressão, e vai querer morrer. E vai tentar ser você mesma de novo,
fazendo regime, arrumando um hobby, falando com suas amigas.
Não vai ser fácil. Não vai ser simples. E não vai resolver.
Você vai sentar no computador, e escrever este texto, e desejar que o
mundo fosse diferente. Porque a revolução feminista (e, ironicamente, a Revista
Cláudia também) cobra da gente ser mãe, empresária bem sucedida, cabeça no
lugar, gostar de sexo, ter um corpo saudável, e, de quebra, saber cozinhar (tá,
isso é só a revista Cláudia).
Mas que horas que eu você vai fazer tudo isso? Façamos contas simples:
- 7:00 Acorda, faz chapa no cabelo e maquiagem
- 8:00 Café + trânsito, chega no trabalho
- 17:00 Sai do trabalho (se quiser ser bem sucedida tem
que dedicar)
- 18:00 Trânsito de volta + banho
- 19:00 – 20:00 Fazer comida e brincar com o(a)(s)
filho(a)(s)
- 21:00 – 22:00 Paga contas na internet / Faz
supermercado / Chama o cara para arrumar a descarga / Compra uniforme para
o(a)(s) filho(a)(s) / Corta cabelo / Faz ginástica
- 23:00 Dormir
Neste esquema, você trabalha 8h e dorme 8h, é verdade, mas só vê o(a)(s) filho(a)(s) por 2h no dia. Péssima
mãe. Vamos tentar de novo?
- 7:00 Acorda, faz chapa no cabelo e maquiagem
- 8:00 Café + trânsito, chega no trabalho
- 12:00 Sai do trabalho
(meio horário, tranquilo)
- 14:00 Leva o(a)
filho(a) no futebol/natação (seu salário de meio expediente não dá para ter
empregada e babá, que dirá motorista)
- 15:00 Banho e lanche
do(a) filho(a)
- 16:00 – 17:00 Filho(a) vendo TV, você arruma a casa e
toma banho
- 18:00 Paga contas na internet / Faz supermercado /
Chama o cara para arrumar a descarga / Compra roupa para o(a)(s) filho(a)(s) /
Corta cabelo / Faz ginástica
- 19:00 – 20:00 Fazer
comida e brincar com o(a)(s) filho(a)(s)
- 22:00 Transar
- 23:00 Dormir
Neste novo esquema, você fica com seu filho 8h, dorme 8h, e consegue até
transar(!) mas só trabalha 4h no dia, o que significa que nunca terá uma
carreira que preste, pois os homens do seu trabalho vão fazer “o esforço
extra”, e ganhar as promoções. Vamos
tentar de novo, só que agora você é homem?
- 8:00 Acorda, Café + trânsito, chega no trabalho
- 17:00 Sai do trabalho
- 18:00 Trânsito de volta + banho
- 19:00 – 20:00 Brincar com o(a)(s) filho(a)(s)
- 21:00 - 22:00 Ler / Ver jornal / fazer ginástica
- 23:00 Transar
- 24:00 Dormir
Neste esquema masculino, você trabalha 8h, dorme 8h, tem duas horas de
lazer para você (jornal) e ainda transa! Vê o(a)(s) filho(a)(s) por 2h no dia,
mas NÃO SENTE A MENOR culpa, pois está fazendo o seu papel, que é ganhar o pão
de cada dia. Não tem que estar “bonito”, pois ninguém vai te julgar por isso.
Sei o que você tá pensando agora: meu marido pode dividir as tarefas
comigo. Sim, pode. Mas não, não vai. Porque ele não tem a urgência interna que
você tem de arrumar a casa. Para ele, o esquema acima está ok, e se a casa não
tiver comida, ele come fora ou pede pizza, se a descarga não funcionar, ele usa
o outro banheiro, se o menino não tiver uniforme, vai de pijama para a escola.
E você vai ter que viver com isso, se quiser dividir. Se duvida, pergunte a
qualquer um que morou em república. Mas você tem que se alimentar
saudavelmente, e tem nojo de banheiro sujo, e, se o menino volta da escola com
um bilhete, nunca tá escrito: “Querido pai, seu filho veio de pijama hoje, não
pode.” Além disso, ele vai ficar com menos tempo para trabalhar também, então
ele vai ganhar menos dinheiro. Você já não tem aqueeeeela carreira, então, vale
a pena?
Não, não vale. Então, já se acostume com a ideia de que você não vai ser
ALGUÉM na vida, você vai ser alguém. Você vai estar nos bastidores, ajudando, fornecendo
estrutura, resolvendo o dia a dia.
Você não vai inventar a lâmpada, vai trocar a lâmpada queimada. Você não vai desenvolver a cura da AIDS, vai lembrar de levar o cartão
de vacinação. Você não vai trabalhar no escritório, mas vai ajudar a comprar os móveis
para ele. Você não vai ter seu nome impresso no cartão comercial, mas vai
buscá-lo na papelaria. Você não vai ouvir seu filho agradecendo à você na hora de receber o
Oscar, ou o Nobel (isso é para pai), mas vai ouvi-lo chamando seu nome um
milhão de vezes por dia pedindo de tudo.
Você nunca vai ser muito boa em nada, mas vai resolver quase tudo. Não
vai dar muito orgulho, vai dar muito trabalho.
Só estou te contando isso para, quando você se tornar eu, talvez não
fique chorando até as 2 da manhã escrevendo isto. Ou talvez procure encontrar
soluções diferentes. Eu não consigo, e eu sinto muito, pois não sei o que dizer
para a Alice, nossa filha, quando ela me diz que quer ser “Astronauta,
veterinária, médica e pizzaiolla” quando crescer. E eu penso, não será.
Será mulher, e não será suficiente.
Ana de Oliveira
Rodrigues
Ph.D. em Engenharia
Elétrica
05/Nov/2010
Meu Deus do céu, você é eu, eu sou você, que isso,? E aí? minha realidade é sua realidade, fico triste com Isso, minha sensação de culpa é tão grande, trablhei isso na terapia, mas não adianta, minha falta de paciencia com a falta de iniciativa dos outros me incomoda profundamente, e o meu marido tem o atrevimento de falar que eu deveria cuidar melhor da minha carreira, mas se pedir qualquer coisa básica pra fazer, sai de finininho, porque ele tem que trablhar, e o meu trablho? Engraçado, quando alguém adoece, eu cuido, quando eu adoeço, ninguém nem aí, festa de aniversário, preparo a festa de todo mundo, mas a minha ninguém prepara, e vai por aí, infelizmente e ainda tem umas meninas loucas casar, e eu fico doida pra fazer mudcar de ideia, deixa disso gente, casamento é uma farsa de felicidade, a unica coisa que vale a pena nisso tudo são os meus filhos, que eu amo muito,.
ResponderExcluirAna gostei demais dessa carta, leu os meus pensamentos, parabéns. Um abraço