19 de julho de 2013

Sempre é cedo demais : O livro que deu origem à série

Há muitos, muitos anos atrás...

... eu comecei a escrever um livro.

Ele mudou de forma, conteúdo e objetivo várias vezes. Foi uma coleção de contos, um romance compriiido, um monte de pequenas histórias. Em 2008, eu compilei tudo que ainda gostava em um grande PDF chamado "Sempre é cedo demais" (por causa de um poema no final do livro).

De uma certa forma, foi o caminho para chegar no meu blog, e me orgulho dele. Assim, decidi publicá-lo aqui, em partes, começando hoje. Com vocês, minha obra prima!


Sempre é cedo demais
Ana de Oliveira Rodrigues 
19 de julho de 2013


Agradecimentos
Gostaria de agradecer primeiramente aos meus pais. Sem crescer em uma mistura de compulsão, excesso de amor, inteligência absurda e temperamento explosivo, eu jamais seria o que sou, o que seria uma pena. Minhas irmãs não escaparam ao mesmo destino, e tornam minha família completa.

Em segundo lugar, agradeço ao meu marido, constante universal em um mundo de caos e improbabilidade. Simplesmente por ter me impedido de enlouquecer dezenas de vezes, você tornou este livro possível. Por dar razão à minha vida, você o tornou importante.

Agradeço aos muitos amigos que vieram, ficaram ou foram embora, em especial neste momento à Karina, que me mostra quem eu era, à Ruth, que me mostra quem eu posso ser, à Dani, que me mostra quem eu sou e à Lígia, que me mostra quem eu serei.

Por fim, agradeço às minhas filhas Alice e Rosa, que fazem com que tudo faça sentido. Que vocês possam aprender com os meus erros, para que os seus sejam mais divertidos.


Parte I
Contos, Histórias e Outras Verdades


Capítulo 1: A garota, a Moça e eu

A garota sobe na calçada. Ela tem vinte e cinco anos, e lê um livro. Ela está sempre lendo. A maior parte da vida dela é gasta lendo livros. Ela está lendo agora, e ela está andando. 

Na hora que eu a olho, ela está sorrindo. Alguém no livro fez algo simpático. A garota imagina que foi com ela, e fica feliz. A garota quer viver dentro dos livros que lê. Ela gosta dos livros com romance, mas não romance bobo. Ela gosta daqueles em que você sabe desde o começo quem vai ficar com quem, e os casais passam por dificuldades juntos, não aquela bobagem de tentar se encontrar por anos e no final casar e ser feliz para sempre. 



A garota sabe que ninguém é feliz para sempre, e estes finais sem sentido a irritam. Ela casou. Ela sabe que a história não acaba aí. Que os problemas estão só começando quando você diz: “Sim”. E ela acha que é nova demais para já estar tão cansada. O Rapaz no livro faz a Moça do livro feliz. E a garota queria ser a Moça. 

Eu olho a garota sem ela saber que eu a observo. Ela usa um rabo de cavalo, jeans, uma camiseta branca e um tênis velho. Ela fica no limite do estar desarrumada. Mas ela tem uma corrente de prata no pescoço. É o símbolo de toda a vaidade dela, é um símbolo oriental para “Prosperidade”. A garota não é supersticiosa, mas o colar foi presente da irmã dela. Ela sente saudades da irmã e usa o colar.

Incongruentemente, suas unhas estão feitas. São unhas longas, bem cortadas, não combinam com o rabo de cavalo, com o tênis ruço. Mas combinam com o sorriso da garota. Ela sorri delicadamente, um sorriso de quem não sabe que tem um tênis ruço. É o sorriso de quem usa um vestido preto colante, é linda e confiante, e sabe que tem o mundo aos seus pés. É o sorriso que a Moça sorriria, se existisse. 

De repente, a garota não está sorrindo. Ela está atravessando a rua, olhando para os lados. Pensando no Rapaz e na Moça. Tirar os olhos do livro faz ela ver que a vida dela é muito diferente do livro. Ela suspira, e volta a ler. Em breve, chegará na estação de metrô e poderá ler sentada. 

Eu a sigo, na plataforma, no metrô. Ela quer falar com as pessoas em volta. Ela quer fazer amigos. Ela quer viver as festas, as noites de porre e drogas. O sexo inconsequente. O dinheiro que é demais ou inexistente. Mas a garota não tira os olhos do livro. A Moça faz todas estas coisas por ela, ela só precisa ler. Não parar de ler. 

A garota entra no elevador, e se vê refletida no espelho. Ela sabe que deveria estar mais magra. Que o cabelo dela deveria estar mais arrumado. Que ela devia pelo menos ter posto um batom. Eu também a observo, sem ela perceber. Eu percebo que ela tem um olhar triste e doce. Que suas mãos, com unhas de dama, são pequenas e lindas. Que ela ainda guarda alegria no jeito de andar.

Ela sai do elevador, cantarolando, já esquecida do espelho. Lendo de novo. Ela dá três passos, para, fecha o livro. Acabou a última página. Ninguém casou no final. Mas a Moça e o Rapaz estão felizes, juntos. E vão ficar juntos para sempre, porque o livro acabou. Eles vão ficar congelados assim. E a garota queria estar congelada também. Mas ela tem que se mexer. Ela tem que dar mais um passo, mais dois. Chegar à sala, ligar o computador, viver.

Ela ainda olha o livro fechado nas mãos. Ela quer lê-lo de novo. Mas agora não tem mais graça. Ela fica congelada também. Parada entre o elevador e a sala. Eu ainda a observo. Sei que, se ela se mexer, talvez algo se quebre dentro dela. Ela vai voltar a ser a garota. Ela ainda quer ser a Moça. 

A capa do livro fechado ainda captura seus olhos. Ela relê o título, duas, três vezes. Parece querer se convencer de que tem um livro nas mãos. Lentamente, ela começa a se mover. Eu assisto, quase em pânico, o tênis velho sair do chão. A garota levanta os olhos, alcança a porta, olha em volta, e se senta. Ela põe o livro sobre a mesa, e ainda lê o título uma vez mais. 

Liga o computador, abre o processador de textos. E começa a escrever. “A garota sobe na calçada”. Eu dou um sorriso. A garota também sorri. A garota sou eu. E, desta vez, a história vai terminar como deveria.
(amanhã: Capítulo 2:  A Caminho do Cemitério)

Um comentário:

  1. Olá Ana,
    boa tarde!

    Meu nome é Patricia e cheguei até o seu blog através do face (mandei um inbox para vc lá também). Estou buscando contatos que queiram participar de discussões a partir da leitura do Livro Lean In. Vis que você formou um circle no mighty bell e te adicionei e pedi para ser adicionada.

    Seria muito bom poder falar com você e dividir experiências.

    Seguem meus contatos:
    https://www.facebook.com/pgrsiqueira
    https://www.facebook.com/groups/598992790146407/

    Abraço,
    Patricia

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