Paz entre as mães... |
O primeiro critica esta atitude, dizendo, em resumo, que esta é a derrota do feminismo, já que as mulheres estariam se identificando apenas como mães, ignorando todas as conquistas do feminismo. Igualando estas mulheres a pessoas sem identidade, desprovidas de ambição.
Os outros dois, um meio piegas e o outro meio irritado, defendem a honra e direito de ser mãe, uma tarefa sublime e uma das maiores (se não a maior) conquista de uma mulher.
Eu fico triste com todos eles. Esta guerra entre Maternar x Trabalhar é um caso clássico de economia, como eu aprendi em um livro divertidíssimo sobre teorias econômicas aplicadas à criação de filhos ("Parentonomics" de Joshua Gans). A idéia básica é esta: toda vez que duas escolhas opostas apresentam muitas vantagens e desvantagens, com opções complexas e cheias de variação, fica muito difícil decidir qual é a melhor escolha. Neste cenário, ao tomar a decisão, você acaba tendo que radicalizar as vantagens da sua escolha, ou as desvantagens da outra, para justificar a sua decisão.
No caso específico do Maternar x Trabalhar, cada mãe (e cada pai) vai ter que equilibrar seus valores, suas condições financeiras, seus talentos e o que é melhor para ela e sua família, e duas famílias nunca serão iguais.
Ao decidir trabalhar fora, tenho mais dinheiro, uma carreira cheia de conquistas e desafios estimulantes, não dependo do meu companheiro economicamente. Eu decido que não tenho talento para criar filhos em tempo integral. A maioria das pessoas assume isto automaticamente de todo homem. Que ele vai ser melhor trabalhando fora de casa do que cuidando das crianças. Uma mulher querer ser assim é meio um insulto. Ela tem que ser sem coração, fria e calculista, para fazer esta escolha. Homens do mundo inteiro fazem esta escolha todos os dias, e não são julgados negativamente por isto.
Do outro lado da moeda, vem a escolha de ficar em casa. Ao decidir estar com seus filhos em tempo integral, estou escolhendo fazer parte de momentos importantes da vida deles. Mais do que criá-los, irei conhecê-los, saber o que meu filho faz, come e gosta. A minha missão e maior conquista passa a ser meus filhos, e aí faz todo o sentido usar as fotos deles como meu perfil, afinal, eles são parte importante de quem sou mesmo.
Os dois lados tem vantagens e desvantagens. Mas a pressão para não errarmos em nossas escolhas, especialmente as relacionadas aos filhos, é enorme. Então a gente radicaliza. A turma do Maternar exagera a alegria obtida com a criação dos filhos e a importância da mãe no futuro do ser humano. A turma do Trabalhar exagera no prazer obtido com a carreira e minimiza a importância do trabalho doméstico. Todo mundo sai perdendo.
Para quem se dedica aos filhos, qualquer problema com eles (genético, comportamental), se torna um reflexo de quem a mãe é. Por exemplo, na reunião com a coordenadora pedagógica da escola da minha filha, ela começou me elogiando pela filha inteligente e líder que eu tinha. Respondi que isso era mérito dela, não meu. Ela: "Mas sem a criação de vocês, ela não seria assim, com certeza." Deixei passar. Logo em seguida, ela me contou das atitudes autoritárias que minha filha estava tendo com os colegas. Ela não disse diretamente, mas eu sabia que ela também achava que isto também era minha responsabilidade. Como já discuti em outro post, já ouvi a frase: "Hitler teve mãe", querendo por a culpa do Holocausto na pobre da mãe do Hitler, ignorando a personalidade dele, o momento histórico, enfim, tudo.
Ironicamente, a pressão em cima de quem decide trabalhar fora é a mesma! Se seu filho está com qualquer problema, é porque você não está sendo presente o suficiente. Quando eu e meu marido viajamos por uma semana, ao voltarmos, minha filha estava com dermatite atópica (provavelmente por nadar em piscina com cloro). Ouvi da pediatra (!!!) que o corpo dela estava reagindo à nossa falta. Trocamos de pediatra, usamos creme hidratante, e, em dois dias, ela estava ótima.
Então, minha proposta é a seguinte: trégua. Ninguém mais vai criticar a escolha alheia. Se as mães de horário integral querem respeito pelo trabalho doméstico, as que trabalham fora vão apoiar. Se as que trabalham fora precisam de creches mais bem estruturadas e não serem acusadas de serem menos mulheres por isso, as mães de horário integral vão apoiar. Se todo mundo quer uma maior participação dos companheiros em ambos os casos, as mães de horário integral abrem este espaço que não precisa ser só delas, e as que trabalham fora valorizam os homens e mulheres que desempenham estes papéis.
E nossos filhos vão ter problemas. Não vão ser perfeitos, nem excelentes em tudo, nem a melhor coisa do mundo. Serão seres humanos, com personalidade própria, com escolhas e erros, com acertos e talentos. Parte disto será nossa responsabilidade, parte será responsabilidade do mundo, do momento histórico, do sorteio genético e das condições em que eles nasceram. Aceitá-los, amá-los e fazer o melhor possível por eles e por nós, mães de todos os tipos e escolhas, tem que ser o objetivo global.
Assim, todo mundo sai ganhando.
Concordo! Mas ainda acho que vc polariza... como vc mesmo apontou. Como se só existissem essas duas opções, dedicação exclusiva ao trabalho OU aos filhos... Há inúmeras maneiras de se dedicar aos filhos e ao trabalho! Doses das mais variadas de cada uma das coisas...
ResponderExcluirÉ verdade. Polarizei porque os dois grupos dos posts inciais são polarizados, como a maioria das pessoas. Mas é verdade que tem muita gente, como eu (e você), que tenta traçar caminhos no meio termo, tentando trabalhar menos, e estar mais com as crianças, mas sem ficar exclusiva em nenhum dos lados. Também merecem respeito, apoio e paz! :)
ExcluirSem contar que se pode ficar em casa com os filhos OU ter que trabalhar muito por motivos que não a sua própria escolha. E é aí que a porca torce o rabo... A nossa visão burguesa, né? De que se pode "escolher" tudo. Cuidar dos filhos com afeto e interesse é também escolha? Ou é possibilidade? Trabalhar meio período pra participar mais da vida dos filhos é escolha?
ResponderExcluirMas no fim, a proposta de PAZ é sempre BOA! Vamos colaborar pro mundo ser mais feliz!
Sim. Julgar alguém, principalmente negativamente, é muito mais fácil do que tentar entender as escolhas, e às vezes as faltas de escolhas, que cada um vive. Já dizia um ex-namorado meu: "Mãe, mesmo quando está errada, ainda está 50% certa"... Essa frase falava muito sobre como a gente devia encarar as opções de cada pessoa.
ExcluirGostei do texto com os comentarios esclarecedores que se seguiram. Reforçando a ideia de que temos limites externos para as escolhas individuais, historicamente pertencemos à classe média, que luta ferrenhamente para manter a ideia de que podemos escolher entre mais trabalho e menos trabalho: quem pode deixar de trabalhar duas horas por dia é porque não precisa deste dinheiro para sobreviver, não acham?
ResponderExcluirSem dúvida. Ou porque a carreira permite. Em profissoes muito competitivas isso nao é uma opção nem para quem pode arcar com os custos financeiros...
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